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DESPEDIDA INDIGNA Brasil aparece entre os piores em cuidados paliativos

Tabu em torno do fim da vida e insistência em tentativas que apenas prolongam o sofrimento de doentes terminais e suas famílias deixam o País entre os últimos colocados na chamada qualidade de morte. Brasil ficou em 38º lugar entre 40 países em pesquisa que considerou critérios como número de leitos, oferta de cuidados paliativos e formação de profissionais sobre o assunto

Objetivo dos cuidados paliativos é amenizar a dor e o sofrimento de pacientes terminais e de suas famílias

O Brasil não é um bom lugar para morrer. O tabu em torno do fim da vida e a cultura que incentiva o investimento em incansáveis tentativas de prolongar a existência de quem já está em estado terminal são fatores que influenciam a chamada qualidade de morte no País. Médicos e profissionais de saúde ouvidos pela reportagem da FOLHA admitem que a adoção de cuidados curativos em vez dos chamados cuidados paliativos apenas prolongam o sofrimento de doentes terminais e suas famílias, sem oferta de possibilidade de sobrevida com qualidade. 

A percepção de quem trabalha na área reforça pesquisa publicada no início da década pela "The Economist". A publicação inglesa investigou sobre a qualidade morte em 40 países a partir de critérios como número de leitos, oferta de cuidados paliativos e formação de profissionais em relação a isso. No ranking, o Brasil ficou em 38º lugar. 

O médico cirurgião César Bortoluzo, especializado em gestão de saúde e líder executivo da empresa Delphus, no Rio de Janeiro, trabalha com gestão de hospitais e instituições de saúde para melhorar a qualidade, a segurança e a eficiência da assistência aos pacientes. Um dos focos do atendimento prevê a oferta de cuidados paliativos a doentes terminais, o que nem sempre é bem aceito pelas equipes médicas. 

"No Brasil, a tradição cristã e católica mais arraigada leva a uma reação negativa perante a situação de morte, uma não aceitação do fim da vida. Esse é o ponto principal a se trabalhar, porque os profissionais também estão nessa cultura e muitas vezes espera-se que eles não cedam ao fato inexorável de que todos nós vamos morrer", analisa. 

Tal contexto traz como consequência o prolongamento da dor e do sofrimento de pacientes terminais e suas famílias, submetidos a procedimentos invasivos que buscam o diagnóstico e a cura de quem não tem mais chances de superar a doença. "Os profissionais são levados à obstinação diagnóstica e terapêutica por cobranças externas e, muitas vezes, por eles próprios não aceitarem que o paciente vai morrer. O conceito de cuidados paliativos vem dessa necessidade de entender que em determinadas situações não há mais volta, mas que o tempo até a morte, se ficarmos buscando milagres terapêuticos, causa sofrimento muito grande ao paciente e à família", pondera. 

Ele aponta que uma das maiores necessidades para reverter a posição do Brasil no ranking da qualidade de morte é a capacitação dos profissionais para lidarem com o fim da vida. "A disciplina não é comum nas faculdades de medicina, mas de uns tempos para cá o ambiente para discutir o assunto está bastante favorável. As próprias famílias estão entendendo melhor que, quando a pessoa está gravemente doente, uma boa possibilidade é não se fazer mais nada para agredi-la", aponta, destacando que o treinamento dos profissionais é importante até para entender que a falibilidade da vida humana e da ciência existem. "O que podemos fazer? Usar a ciência para dar conforto ao paciente e à família", completa. 

Não adotar tratamentos curativos não significa deixar o paciente "morrer à míngua". A adoção dos melhores procedimentos precisa ser debatida com a família, o que demanda uma habilidade não técnica de se colocar no lugar do familiar e saber conduzir a comunicação. Além disso, é preciso preparo para decisões técnicas que podem melhorar a dor e o desconforto respiratório, por exemplo, através de medicamentos e procedimentos. "Dessa forma a morte se torna menos dolorosa e o momento é percebido como menos doloroso também pelos familiares", diz. 



CUIDADOS FÚTEIS 
A neurologista Nazah Cherif Mohamad Youssef é conselheira do CRM-PR (Conselho Regional de Medicina do Paraná) e responsável pela câmara técnica de cuidados paliativos da entidade. Ela concorda que a qualidade de morte é ruim no Brasil exatamente porque não há oferta de cuidados paliativos para melhorar a qualidade dos últimos dias de vida. "O paciente recebe cuidados terapêuticos muitas vezes fúteis que apenas prolongam o sofrimento e o levam a morrer longe da família e sem ter os últimos desejos realizados." 

A médica enfatiza que os médicos são aptos a reconhecer os casos em que não há mais possibilidade de cura, como o de doenças cardíacas graves, portadores de enfisema pulmonar e pessoas com câncer que não respondem mais ao tratamento, entre outros exemplos. "Isso é um paciente terminal. Nesse caso, a equipe tem que passar dos cuidados terapêuticos para os paliativos, o que inclui analgesia para não sofrer, inseri-lo no ambiente da família, se alimentando como conseguir e quiser", mostra. 

Questionada sobre os motivos que levam os profissionais de saúde a negarem a escolha dos cuidados paliativos, ela justifica que, muitas vezes, o paciente é atendido na emergência por um médico que não conhece sua história. "Sofrem também pressão das famílias, que desejam que seja feito "o máximo " mesmo que não seja o melhor para o doente", diz. 

Nazah contrapõe que, apesar de ainda haver um longo caminho a ser percorrido para disseminação dos cuidados paliativos, o assunto tem sido cada vez mais discutido em congressos e outros eventos médicos e, hoje, já é reconhecido como área de atuação tanto pelo Conselho Federal de Medicina como pelas diversas especialidades. "Há um consenso de que os cuidados paliativos são o melhor para pacientes terminais e que o atendimento tem que ser multidisciplinar, o que envolve enfermeiros, psicólogos e assistentes sociais", esclarece. 

"Nossa época é de negação da morte 
O interesse de alunos de diferentes cursos de graduação pela disciplina de tanatologia, que o doutor e psicoterapeuta Cloves Amorim oferece no curso de psicologia na PUC de Curitiba, é um bom termômetro para medir o interesse crescente da área de saúde pelo tema do fim da vida. O curso oferece os módulos "a morte e o morrer", "luto", "suicídio" e "cuidados paliativos".

"Sempre faltam vagas para atender todos os interessados, porque falta formação na área", acredita. 

Especializado em atender pessoas na fase do luto, Amorim afirma que a época atual é de negação da morte. "Tudo o que diz respeito ao assunto tende a ser camuflado, escondido ou negado", afirma ele, lembrando que em outros períodos históricos a morte estava no centro da cultura, como foi o caso do Egito Antigo, suas pirâmides e o Livro dos Mortos. "Com o cristianismo, essa cultura foi reorganizada e, hoje, na sociedade capitalista, morte significa fracasso. Tanto que nos ambientes de saúde ninguém diz que uma pessoa morreu, eles dizem que perderam o paciente", demonstra. 

Tal contexto, segundo o professor, afeta a saúde mental na medida em que cria nas pessoas o mito de que a morte pode ser vencida. "O resultado é a adoção de esforços extraordinários através da medicina curativa em um lugar que devia ser ocupado pela medicina paliativa", analisa. Familiares expostos a essa situação vivem a ambiguidade de esperar que "tudo se acabe" e cesse o sofrimento do indivíduo ao mesmo tempo em que alimentam a possibilidade do ente querido ser salvo. 

LUTO 
Ao fim do processo, também não é fácil viver o luto. Amorim critica um protocolo do DSM-5 (Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais) que, em 2013, passou a prever o luto como doença. "Ocorre que, em 1917, Freud escreveu o livro "Luto e Melancolia " e, desde então, compreende-se que luto não é doença, é uma experiência que muitas vezes pode ser fértil, produtiva e até provocar ganhos em qualidade de vida", comenta. 
Experimentar o luto saudável – em oposição ao luto complicado – começa com a aceitação das características do luto normal, incluindo tristeza, episódios de raiva e culpa, ansiedade, solidão, desamparo, saudade, alívio e sensação de presença da pessoa morta. Além disso, espera-se que a pessoa enlutada, em um período de tempo que pode chegar a um ano – apesar de variar de indivíduo para indivíduo - , seja capaz de cumprir quatro tarefas. 
A primeira delas é aceitar a realidade da perda. "No início tem-se a sensação que a morte não aconteceu, que estava sonhando", exemplifica. O próximo passo é processar a dor do luto, lembrando que cada um vive essa fase de um jeito, mas é preciso aprender a assimilar a perda e conviver com a dor. 
O terceiro passo é ajustar-se ao mundo sem a pessoa morta, tanto no dia a dia, assumindo tarefas que cabiam a ela, como também em relação a ajustes internos, o que depende do grau de resiliência de cada um. "Nesta fase, é preciso se perguntar: quem sou eu agora?", ensina. 
O psicoterapeuta observa que os filhos que perdem pais se definem como órfãos e os cônjuges se tornam viúvos. "Mas ainda não há uma palavra para definir pais que perdem filhos, porque a cultura ainda não conseguiu elaborar um nome para isso", comenta. 
A última fase do luto implica em encontrar uma conexão duradoura com a pessoa morta em meio ao início de uma nova vida. "Nessa fase, já é possível lembrar da pessoa sem chorar, pois a dor está contida", define. O especialista defende que não se deve estimular a esquecer quem morreu, "mas guardá-lo no amor e na memória". 

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Fonte: Folha
Por: Redação
Data: 15/07/2017 14h13min

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